A EDUCAÇÃO 5.0 EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS E SUAS CONTRADIÇÕES

Imprensa | 23/05/2023



A propaganda da Educação 5.0 anunciada pelo governo de São José dos Campos está muito distante daquilo que acontece no cotidiano das salas de aula do município.

A Educação 5.0 é tida como uma combinação do uso de tecnologias digitais com o desenvolvimento de habilidades cognitivas e socioemocionais no processo de ensino e aprendizagem. Para a implantação dessa “revolução educacional”, exige-se do corpo docente múltiplas capacidades, tais como o domínio acadêmico nas áreas curriculares específicas, da prática pedagógica, das questões psicológicas que envolvem o trabalho com pessoas e das tecnologias digitais. E mais: ser capaz de identificar deficiências e potencialidades dos alunos para utilizar estratégias de ensino capazes de dar conta de todas essas especificidades.

Diante de tão grande desafio, era de se esperar que a capacitação técnica dos professores articulada à valorização profissional fosse considerada o eixo central para o sucesso da Educação 5.0, além de investimentos na infraestrutura das escolas. É precisamente neste ponto que se pretende focar ao analisar mais de perto a implantação desse modelo educacional na “cidade da tecnologia”.

Em primeiro lugar, a oferta compulsória do curso de Pós-graduação em Educação 5.0 a todos os educadores da rede municipal, sob a tutela da UNESP, nem de longe atende à proposta de implantação de práticas pedagógicas inovadoras nas escolas. O curso oferece pouca interação entre os objetos de conhecimento estudados e os docentes, em função do pouco tempo destinado à leitura de textos, acesso a vídeos e interação com as ferramentas digitais. Ademais, a produção de registros e trabalho de conclusão de curso demandam muito mais tempo do que se dispõe no local de trabalho. Desse modo, o curso se restringe ao cumprimento de tarefas, deixando de lado o debate, o aprofundamento teórico-metodológico e o diálogo entre os participantes.

Em segundo lugar, o curso de Pós-graduação ofertado não traz nenhuma expectativa de valorização e aumento de rendimento aos professores cursistas, uma vez que o plano de carreira vigente não incentiva o aperfeiçoamento profissional. A esse respeito cabe destacar que, recentemente, o governo conseguiu aprovar mudanças na carreira docente que afetam negativamente e desestimulam os professores, pois apenas uma pequena parcela deles, a cada cinco anos, terá oportunidade de progressão salarial. Assim mesmo, os poucos que progridem estão sujeitos à enorme distorção do plano de carreira, devido à incorreta aplicação do piso salarial nacional do magistério.

Em terceiro lugar, a promoção de reformas de infraestrutura com o objetivo de que as escolas da prefeitura recebam uma certificação 5.0, em vez de se configurar como algo favorável ao processo de ensino e aprendizagem, ao contrário, se transfigura como algo ruim, uma vez que o que se observa, de fato, é que tais reformas servem apenas de maquiagem para fins políticos. O maior exemplo disso são as chamadas “salas Google” que, na prática, são os antigos laboratórios de informática, numa nova roupagem, mas com os mesmos computadores de 2014, ultrapassados e com pouca funcionalidade.

Por fim, os “Chromebooks” adquiridos pela Prefeitura para uso dos professores são muito limitados. Somam-se a isso os problemas de conexão com a Internet, necessária ao uso desses aparelhos, situação que obriga os professores a utilizarem seus próprios dados móveis para garantir o bom andamento das atividades escolares.

Assim, cabe indagar: como é possível implementar uma Educação 5.0 em um cenário como esse? O êxito da implantação da Educação 5.0 só será possível com a reformulação do Plano de Carreira do Magistério, estabelecendo-se critérios justos de progressão salarial, aliados a uma carga horária total de 40 horas semanais, divididas igualmente entre atividades de sala de aula e acadêmicas, nos moldes dos Institutos Federais.

Por tudo isso, a Educação 5.0 de São José dos Campos está muito distante de edificar os pilares conceituais e metodológicos desse modelo educacional, resumindo-se apenas a um jargão bonito, com fundos eleitorais, que utiliza a propaganda como difusor de uma imagem equivocada (e distorcida) da realidade.

Daniel Fernandes - Diretor do SindServ-SJC

Valdemir Pereira - Professor da rede municipal e diretor do SindServ-SJC

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